Vida de Gado

Jornal do Commercio

* José Adelmy Acioli é presidente da Associação de Magistrados do Trabalho da 6ª Região (Amatra VI)


* Artigo publicado no Jornal do Commercio no sábado, 17 de setembro de 2016.


Estamos em guerra. Não de armas entre países, mas econômica, em que há pouquíssimos vencedores e milhões de vencidos. Nessa guerra, métodos cruéis são levados a cabo contra nossos concidadãos. A arma utilizada tem o caráter letal da concorrência desenfreada, da exclusão social, da indiferença e da falta de solidariedade. Os ferimentos provocados são, sobretudo, endógenos. Atingem a alma e a esperança das pessoas. Transformam o sentimento de fracasso e o de desilusão de sua própria existência, os quais passam a ser vistos naturalmente como uma sina pessoal do indivíduo atingido pelo desemprego estrutural que extingue milhares de postos de trabalho e não uma questão pública.


Desse modo, banaliza­-se a injustiça social e são exigidos sacrifícios individuais e coletivos cada vez maiores para o bem da ordem econômica, atropelando princípios gerais de Direito consagrados na Constituição, com destaque para o princípio da proteção ao trabalhador.


Com a precarização dos direitos trabalhistas, o trabalhador torna­se apenas um fragmento desumanizado ou um mero figurante no contexto da obra coletiva do projeto social. Como diz o cancioneiro popular, passa a ter uma vida de gado. Alguns podem, a esta altura, estar se perguntando: o que os juízes do Trabalho e o seu movimento associativo têm a ver com isso? Tudo! São testemunhas do sofrimento das pessoas, da exclusão social e dos efeitos das crises política e econômica. Tudo isso lhes passa aos olhos diariamente nas centenas de audiências que são realizadas. Talvez exatamente por isso a magistratura trabalhista esteja sendo amordaçada e a própria Justiça do Trabalho (JT) posta em xeque.


No último ano, a JT bateu recorde histórico de ajuizamento de demandas, muito em função da crise econômica. Sem embargo disso, houve um corte desproporcional no seu orçamento que abarca 30% do seu custeio. Por sua vez, a responsabilidade sobre prazos judiciais e o congestionamento de decisões continuam sendo depositados apenas nas costas de cada juiz. Ao lado da tentativa de inviabilização da JT por inanição econômica, agora vozes cada vez mais audíveis e poderosas no Parlamento ventilam sobre a extinção da JT em um discurso revanchista e odioso em muitos casos.


Tais circunstâncias nos fazem perceber que o movimento associativo dos juízes deve alcançar o patamar amplo da luta política contra a precarização dos direitos trabalhistas, a extinção da JT e abusos jurídicos cometidos no país.