A nota assinala que um magistrado jamais poderá ser punido, dentro das balizas do Estado Democrático de Direito, em razão de suas opiniões ou convicções jurídicas e políticas, notadamente quando disseram respeito a fatos direta e inexoravelmente conexos aos interesses da Magistratura nacional e do Trabalho, como são as reformas previdenciária e trabalhista.
Confira a nota na íntegra:
NOTA PÚBLICA
A ANAMATRA - Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho e a AMATRA VI – Associação dos Magistrados da Justiça do Trabalho em Pernambuco, à vista do quanto publicitado na nota conjunta de 2/6/2017 ("NOTA PÚBLICA EM DEFESA DA INDEPENDÊNCIA FUNCIONAL E DA LIBERDADE DE EXPRESSÃO") e, há pouco, do Ofício n. 660/CN-CNJ, de 30/06/2017, vêm a público explicar e manifestar o seguinte:
- Por meio do ofício n. 660/CN-CNJ, foi solicitado à Presidência do Tribunal Regional do Trabalho da 6ª Região cópia do despacho do Juiz do Trabalho Hugo Cavalcanti Melo Filho, titular da 12ª Vara do Recife, que determinou o adiamento das audiências para efeito da mobilização social do dia 30/6/2017. Além disso, foram requeridas informações sobre seu comparecimento ao trabalho, como também o registro da ausência de servidores da Unidade Judiciária naquela data e, por fim, os dados estatísticos da produtividade do magistrado nos últimos cinco anos.
- As entidades subscritoras reiteram que são assegurados a todos os cidadãos - e inclusive aos juízes, desde que inexista vinculação de fundo político-partidário - as liberdades de pensamento, vedado o anonimato, e de expressão em atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independente de censura ou licença, na forma do art. 5º, incisos IV e IX, da Constituição Federal de 1998.
- Em relação aos juízes, convirá sempre ter em mira o quanto deliberado no Sétimo Congresso das Nações Unidas para a Prevenção do Crime e o Tratamento dos Delinquentes, endossado pela Assembleia Geral das Nações Unidas em suas resoluções 40/32, de 29 de Novembro de 1985, e 40/146, de 13 de Dezembro de 1985, no sentido de que, "em conformidade com a Declaração Universal dos Direitos do Homem, os magistrados gozam, como os outros cidadãos, das liberdades de expressão, convicção, associação e reunião; contudo, no exercício destes direitos, os juízes deverão sempre comportar-se de forma a preservar a dignidade do seu cargo e a imparcialidade e independência da magistratura" (n. 8).
- As liberdades de pensamento e de expressão são pilares inconspurcáveis do Estado Democrático de Direito e fundamentais à independência da Magistratura, na medida em que albergam o exercício dos direitos civis e políticos dos cidadãos e respaldam a garantia coletiva do direito de informação e do conhecimento do pensamento alheio, que se mostram essenciais em qualquer democracia.
- As subscritoras ressaltam, de outro turno, que a requisição de informações sobre a produtividade do Magistrado nos últimos cinco anos sinaliza sério desvio de foco que poderá viciar a apuração em andamento, ante os princípios da determinância, da estrita legalidade e do devido processo legal que regem o direito administrativo sancionatório e que informam, portanto, qualquer procedimento público disciplinar.
- É certo, ademais, que o Magistrado jamais poderá ser punido, dentro das balizas do Estado Democrático de Direito, em razão de suas opiniões ou convicções jurídicas e políticas, notadamente quando disseram respeito a fatos direta e inexoravelmente conexos aos interesses da Magistratura nacional e do Trabalho, como são as reformas previdenciária e trabalhista. Mesmo por outra razão, outros Magistrados - inclusive Ministro de Tribunal Superior - têm se posicionado livremente sobre as mesmas questões de interesse público, emitindo inclusive opiniões deletérias sobre o pensamento jurídico-político de outros magistrados, sem qualquer reprimenda. Da mesma maneira, Tribunais determinaram a paralisação das suas atividades funcionais em outras manifestações sociais recentemente realizadas, sob os mesmos enfoques, descabendo lá, como cá, qualquer pretensão disciplinar punitiva.
- Por fim, registram que a mobilização social do dia 30/6/2017 alicerçou-se no direito constitucional de reunião pacífica e de greve, destinados inclusive aos servidores públicos, conforme capitulado no art. 37, VII, da Constituição Federal e no verbete 534 da Comissão de Peritos da OIT sobre a Liberdade Sindical. Nessa alheta , o próprio Supremo Tribunal Federal já registrou que "a Constituic?a?o, tratando dos trabalhadores em geral, na?o preve? regulamentac?a?o do direito de greve: a eles compete decidir sobre a oportunidade de exerce?-lo e sobre os interesses que devam por meio dela defender. Por isso a lei na?o pode restringi-lo, sena?o protege?-lo, sendo constitucionalmente admissi?veis todos os tipos de greve: greves reivindicato?rias, greves de solidariedade, greves poli?ticas, greves de protesto" (MI n. 712/PA, rel. Min. Eros Grau).
- Por tantas razões, a ANAMATRA e a AMATRA VI manifestam solidariedade ao Juiz Hugo Cavalcanti Melo Filho, como a todo e qualquer juiz que possa vir a ser cerceado em sua liberdade de expressão, e pugnam publicamente contra qualquer investida correcional que atente contra as garantias constitucionais de liberdade de pensamento e expressão de qualquer cidadão, Magistrado ou não.
Brasília/Recife, 3 de julho de 2017.
GUILHERME GUIMARAES FELICIANO
Presidente da ANAMATRA
JOSÉ ADELMY DA SILVA ACIOLI
Presidente da AMATRA VI