A carreira de juiz vem acompanhada de várias preocupações

Num passado não muito distante, nos idos de 1985, a Ordem dos Músicos do Brasil (PE) (1985) registrou um profissional da área que pensava fazer sucesso participando de bandas locais de baile. Um ano depois, a Ordem dos Advogados do Brasil (PE) recebeu o pedido de registro da mesma pessoa, ainda como estagiário, decidida a migrar para a área jurídica.

Como o tempo não para, mais uma mudança estava para chegar na trajetória desse filho da cidade de Maraial (Zona da Mata de Pernambuco), que ingressou na magistratura do trabalho em 1991 e após quase 33 anos depois foi promovido a desembargador do TRT6. Nesta entrevista, Edmilson Alves da Silva, fala sobre sua caminhada, o movimento associativo e paixões: família, hobby e, claro, o time do coração.

Isto Posto (IP) – Porque a Magistratura do Trabalho?

Edmilson Alves (EA) – A iniciativa de ingressar na magistratura, como acontece com muita gente, era um sonho de adolescência, antecipado por um sonho ainda maior, que era ingressar em uma faculdade de Direito, de ensino gratuito, claro. Objetivos atingidos!  Porém, ao lado do sonho, tinha o componente da responsabilidade, da preocupação com a família, porque ainda na universidade já estava casado e pai de dois filhos.

IP – Como foi o primeiro contato com a Justiça do Trabalho?

EA - Não foi fácil no primeiro momento compreender a Justiça do Trabalho e a Magistratura. Isso foi sendo atingido aos poucos. Hoje isso resta muito claro na minha percepção.

Quem começa na carreira como Juiz vem acompanhado de várias preocupações, sobretudo quando se trata de um candidato cuja origem não é das mais pródigas, em termos financeiros (exatamente o meu caso). Então, atuar como Magistrado era, ao mesmo tempo, conviver com remuneração baixa, porque naquele momento (anos 1991 e seguintes) a situação não era das melhores, em termos de salário; havia muito trabalho e imensas responsabilidades, que o cargo traz junto.

IP –Seu concurso foi um dos primeiros na 6ª Região?

EA – Não um dos primeiros concursos realizados na Sexta Região, mas foi o primeiro do qual participei aqui e fui aprovado. Eram tempos diferentes, tudo muito novo para conhecer. Para mim, após uma curta carreira como advogado, ser aprovado já no segundo concurso que me submeti para Juiz do Trabalho (o primeiro dos dois foi na 13ª Região/PB), tendo apenas cerca de três anos desde a conclusão do curso na universidade, havia a preocupação com o estágio probatório, já que era meu primeiro vínculo com o setor público, e principalmente com a estabilidade que se busca ter depois disso.

IP – Como estava a Justiça do Trabalho nesse período?

EA - Era uma Justiça ainda muito informal, das reclamações orais, da figura dos classistas que a mim estranhava muito como algo que fosse realmente necessário para a prestação jurisdicional. Isso, em particular, eu não via como bem encaixado naqueles primeiros anos após meu ingresso no Judiciário. Até que a extinção veio a ocorrer menos de uma década depois.

IP – Qual fato mais marcante nessa trajetória?

EA – Relembro uma questão que foi importante para toda a sociedade: a moralização do Judiciário com o fim do nepotismo, algo que não veio de graça; foi fruto de muitas batalhas, inclusive nas ruas.  Nisso tive o privilégio de estar participando ativamente à frente da Amatra VI, junto com outras entidades, de passeatas, debates, na imprensa, contribuindo para o que depois viria a ser essa nova configuração do que antes envolvia favorecimento de parentes na JT. Ainda não é o ideal, mas foi um grande avanço.

IP – Atuando agora na segunda instância, qual sua visão do futuro da JT?

EA – Esse cenário de futuro é muito novo para mim, que estou só há poucos meses atuando no Tribunal. Mas não me parece, como há muito tempo já venho observando, que o futuro seja promissor, porque a Justiça do Trabalho tem lutado pouco e perdido muito. Tem perdido sua competência, sua autonomia, muita coisa. Enfrenta, especificamente aqui, na primeira instância, dificuldades de anos para seu próprio funcionamento regular. Falta o básico até, e não por outras razões, até o ânimo de Juízes e de servidores se arrefece. Claro que não podemos desistir. É importante entender essas oscilações e resistir o quanto der.

IP – Mesmo na ativa, sua avaliação dos obstáculos abrange também os inativos.

EA – Principalmente no campo da remuneração, sim, porque foi criado um fosso entre profissionais da ativa, que se seguram em alguns penduricalhos até não ser mais possível se segurar; e os inativos, que se queixam com razão dessa disparidade naquilo que deveria constituir a paridade de vencimentos. O Juiz se aposenta após certo tempo garantindo-se na paridade com os ativos, mas, como atualmente ocorre, a disparidade passa a ser uma realidade.

IP – Como o movimento associativo chegou na sua vida?

EA – O ingresso no movimento associativo foi um processo muito natural para mim. Sou filiado à Amatra - e à Anamatra, evidentemente - já desde as primeiras horas em que me foi dada a oportunidade de ser. Ou seja, desde o primeiro mês após a minha posse.  Sempre me senti muito à vontade no ambiente associativo, não exatamente para, eventualmente, estar à frente dela, claro, mas isso também acabou por acontecer.

IS – Teria ocorrido algo que tenha contribuído para essa aproximação?

EA – Lembro bem algo que pode ter impulsionado mais essa vinculação com o movimento, no período de realização do concurso ainda. Vi a associação atuando contra tentativas de mudanças nas regras de contagem de notas na prova dos candidatos (prova de sentença), com a indevida postura surgida não sei exatamente de quem de as notas atribuídas pela comissão sofrerem arredondamentos para mais, beneficiando algumas pessoas. A Amatra já pôde demonstrar que, falando pelos Juízes de então e do futuro, não tinha como concordar com isso - e ao final prevaleceu esse ponto de vista, lógico.

IP – Algum momento foi especialmente marcante nesse caminho associativo, inclusive tendo o sr. presidido a Amatra VI (2004/2006)?

EA – Sem dúvida, foi o movimento contra o nepotismo. Vivenciamos esse movimento, que tinha nos Juízes do Trabalho um forte apoio, ou o principal apoio, e que acabou por acontecer.  Mais adiante, e na mesma linha, a luta pelo estabelecimento do subsídio para o serviço público, o que incluía a Magistratura, claro, que foi muito importante naquela metade dos anos 2000. Pensávamos que isso moralizaria a questão remuneratória do Judiciário como um todo - o que acabou, infelizmente, por não se constatar ao longo de quase duas décadas depois dali.

IP – Deixando de lado o Magistrado, quem é o Edmilson pai?

EA – A vida com filhos, por quem deseja tê-los - e sempre foi o meu caso -, é algo que transforma você até no sentido do que fazer profissionalmente, para assim buscar protegê-los da melhor maneira. Então, filhos e magistratura para mim estão entrelaçados. Lembro de uma vez ouvir num introito de uma canção de Vinícius de Morais ele dizer que Toquinho o havia indagado sobre se valia a pena ter filhos, porque estava querendo ter, e a resposta foi que sim, que filhos dão um trabalho danado, mas que ele, Vinícius, o aconselhava a ter.

IP – A paternidade chegou cedo?

EA - Já era pai de um filho e uma filha ainda estudante de direito, o que já diz o quanto de preocupação havia ali para o futuro, meu e deles. Ao assumir como Juiz, tinha o terceiro filho, com menos de dois anos de idade. Então, ser pai aos 22 anos de idade, estudante ainda, sem uma carreira sequer iniciada, foi um desafio enorme. Visto do lado de cá agora, concluo como era verdadeira a vontade de ter filhos e como eles influenciam positivamente na sua vida.

IP – Mas o pai virou avô!

EA – Hoje, a eles, os filhos, Rafael, Anny e Edmilson Júnior, se somaram aqueles que, aí sim, transformam mais ainda os avós, no lado emocional, na postura, na prioridade, em tudo: os netos. E nesse combo estão Ana Júlia, com 15 anos; Guilherme, com 10 anos; Daniel, com 5 anos; Bernardo, com 4 anos; Rafael, com 4 anos; e, mais recentemente, Edmilson Neto, com 4 meses. Não precisa falar mais nada para entender o avô. Estar sendo demandado por um deles, por dois ou por todos, em algum momento do dia, é algo que ajuda muito a entender a razão de ser humano.

IP – Quando sobra tempo e não está com a família, o que fazer?

EA – A vida na Magistratura acaba contribuindo para não ter hobby, ou, se tiver, para esquecê-lo ou não praticá-lo.  Consome mais tempo do que aquele que a gente acaba destinando a nós mesmos ou à família. Mas, a despeito disso, dá para administrar um pouco, inclusive o hobby da música, depois de ter sido profissional da música também, com inscrição na Ordem dos Músicos do Brasil - Secção PE, no ano de 1985, participado de algumas bandas locais de bairro; e ao longo dos anos, em fase nas quais os processos são menos e as horas livres são mais, estar ao lado de amigos músicos e de filhos, tendo o prazer de cantar, arranhar um violão ou até mesmo executar algumas músicas no trompete, vem sendo possível.

IP – A paixão pelo Sport Clube do Recife é declarada e familiar. Não tem dia de estresse?

EA - O Sport Club do Recife é um caso à parte. Mas sempre se reinventa. É uma paixão que tem de ser bem administrada “no juízo”, para não enlouquecer a gente. Os filhos, claro, “aderiram” às cores; e os netos já estão todos bem “encaminhados”, desde o nascimento. Até mesmo meu especial cunhado, Tote, conhecido de muitos associados, não deixa de querer uma camisa nova todo ano. É isso ou ninguém tem paz!

IP – Algo mais a acrescentar?

EA – Apenas agradecer o espaço nesse veículo, que faz parte da nossa convivência de tantas décadas, expondo um pouco a vida dos seus associados. Então, só agradeço pela convocação a mim feita para esta entrevista.

 

Crédito da foto: Comunicação TRT6/ Roberta Mariz e Helen Moreira