Aclamado pela crítica especializada, o filme “Irina Palm” marca a retomada do Cine Amatra. A sessão está marcada para o dia 19 de outubro, às 17h, no auditório da Amatra, seguida de debate. Com direito a pipoca, todos e todas estão convidados!
Confira abaixo a resenha do filme escrita pelo diretor cultural Fábio Furtado:
Irina Palm: um filme sensível que foge do lugar-comum
Seguindo com a programação do nosso Cine Amatra, exibiremos em nossa sede, no dia 19 de outubro, a partir das 17h, o filme “Irina Palm”. Através deste, damos continuidade à nossa missão de exibir filmes que proporcionem momentos de descontração e diversão, mas também nos tragam reflexões sobre questões relevantes dos nossos tempos, sempre com leveza, para que possamos nos desligar um pouco das atribulações do dia a dia.
Vale salientar ainda que, para que o projeto se torne mais atrativo aos associados, buscamos trazer filmes de alta qualidade artística e que não são facilmente encontrados nas plataformas de streaming mais populares. “Irina Palm” apresenta a história de uma senhora viúva que precisa urgentemente conseguir um trabalho remunerado, a fim de custear o tratamento de saúde de seu único neto, acometido de uma grave doença, que necessita de um transplante de urgência.
Não conseguindo empréstimos em bancos ou trabalhos mais convencionais, perambulando à noite por ruas soturnas do Soho Londrino, ela encontra um anúncio de trabalho em um sex club como recepcionista. Sem saber muito bem o que iria encontrar, resolve se candidatar à vaga e acaba sendo contratada, muito embora não exatamente como recepcionista. Com pouco tempo ela se destaca no exercício do seu ofício, aumentando a movimentação do estabelecimento e, consequentemente, os lucros, o que lhe faz auferir um bom volume de dinheiro, para cumprir com seus objetivos. No entanto, o seu sucesso nas atividades gera incômodo entre suas colegas de trabalho e nos outros estabelecimentos concorrentes, além de comentários maldosos na vizinhança, também provocando desconfiança em seu filho.
Trata-se de um filme da Bélgica, lançado em 2007, recheado de humor refinado e contido, embora possa se classificar mais como um drama. Aborda relações de trabalho tidas como “marginais”, muito embora se apresentem de forma escancarada às vistas de qualquer um, tanto em estabelecimentos mais luxuosos, quanto em outros de condições mais precárias. A principal temática, todavia, a nosso ver, é a hipocrisia tão presente na sociedade de classe média, em que se costuma tratar com tamanho rigor práticas menores tidas como “imorais”, que infringem os “bons costumes”, mas sem se dar importância a outras que seriam até mais graves, ou que deveriam gerar maior espanto, mas que são aceitas com mais naturalidade, desde que não praticadas às claras.
A atriz principal, Marianne Faithful, que faz o papel de Maggie, ou de “Irina Palm”, nos entrega uma atuação soberba, conseguindo transmitir com precisão a dramaticidade de sua personagem, em momentos de constrangimento, de tristeza, mas também de persistência e de determinação. Interessante que tal atriz obteve muito mais notoriedade em sua carreira de cantora, na qual se destacou na cena londrina das décadas de 1960 e 1970, em plena era de “sexo, drogas e rock and roll”, em que mergulhou a fundo. Chegou a namorar o cantor Mick Jagger e dele gravou algumas canções. Também gravou com astros diversos como David Bowie e Beck e ainda atuou em filmes de Godard. No entanto, passou por momentos dramáticos, chegando a morar nas ruas de Londres, em consequência do seu vício em drogas como a heroína.
Felizmente, não sucumbiu a tais adversidades, vindo posteriormente a lançar discos de relativo sucesso e voltar a atuar em filmes. Atualmente, após sobreviver à infecção pela Covid-19 e deixar seus fãs bastante preocupados, ela vive em um lar para idosos. A direção do filme é de Sam Garbarski, cineasta alemão, sendo este o seu segundo longa-metragem. O roteiro é coassinado por ele, juntamente a Phillippe Blasband e Martin Herron. No elenco, além de Marianne, também estão os atores Kevin Bishop e Miki Manojlovic.
Pela sua narrativa e pela temática abordada, o filme poderia desaguar num humor vulgar ou em cenas apelativas. No entanto, a direção precisa, o roteiro muito bem engendrado e a atuação excelente da atriz protagonista afastam qualquer aspecto que pudesse diminuí-lo.
Ainda que composto por cenas predominantemente escuras, noturnas, o filme termina por transmitir momentos de pura luminosidade, de esperança e de admiração pelas atitudes das pessoas de bom caráter e de bom coração, que não medem esforços para salvar aqueles que amam, mesmo que para isso tenham que passar por cima de certos valores e enfrentar o preconceito e a hipocrisia da família e da sua comunidade.
Para quem aprecia um bom filme europeu, que foge do lugar-comum, trazendo uma bela e sensível história, que no final nos deixa com um sorriso de satisfação no canto da boca, recomendamos que não deixem de prestigiar este evento na sede da nossa Amatra, que será acompanhado, como sempre, de uma boa pipoca, e ótimas conversas após terminar a exibição”.